Os pais do menino não apresentaram queixa e nem sequer levaram a criança ao hospital. A mãe tratou das "feridas abertas" do filho em casa e mudou-o de escola. São refugiados, sabem que às vezes é preciso fugir.
Quando eu tinha nove anos uma das minhas colegas de escola batia-me por dois motivos: os meus pais eram divorciados e eu nascera em África. Não era sequer o meu tom de pele que a incomodava, afinal era igual ao dela, mas antes não aceitar que eu tivesse nascido noutra terra e o facto da minha família ser "estranha".
Ela batia-me e eu batia-lhe de volta, os miúdos, iguais a eles mesmos, faziam círculos e apostas e esperavam para ver quem "ganhava". O troféu coube sempre à ignorância.
Não me lembro de alguma vez ter ouvido um professor ou um pai a insurgir-se contra a patetice da minha colega. Aos nove anos não achamos nada estranho a não ser que alguém nos ensine a olhar de viés a diferença.
Quase quatro décadas depois, em Portugal, uma criança nepalesa foi linchada por cinco colegas de escola, enquanto um sexto filmava. O caso foi denunciado pela diretora executiva de uma instituição da Igreja e é por ela que sabemos que, enquanto batiam, os miúdos proferiram frases racistas e xenófobas. Tanto ódio em corpos franzinos.
Os pais do menino, imigrantes, não apresentaram queixa e nem sequer levaram a criança ao hospital. A mãe tratou das "feridas abertas" do filho em casa e mudou-o de escola. São refugiados, sabem que às vezes é preciso fugir.
Da escola, silêncio.
Dos agressores, silêncio.
Do menino agredido, trauma. Todos os dias tem pesadelos.
E se fosse o teu filho?