Uma Justiça sem eufemismos para o ódio e o "conto do vigário" - Triplov INFO

Últimas

sexta-feira, 28 de junho de 2024

Uma Justiça sem eufemismos para o ódio e o "conto do vigário"


 
JN
 
INÊS BANHA
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Em "Intimidades", romance de 2021 da norte-americana Katie Kitamura, a personagem principal, intérprete no Tribunal de Haia, atribui a certa a altura a "ansiedade" que ali se vive ao facto de a sua "atividade diária assentar na descrição repetida" de assuntos que, fora da sala de audiências, "geralmente" são "sujeitos a eufemismo e elisão". Em Portugal, não são, por norma, julgados crimes de guerra, mas a reflexão poder-se-ia aplicar ao roteiro da Justiça nacional desta segunda-feira, seja por se acreditar que os atos sob suspeita nunca poderiam acontecer, seja por se estar convicto de que só cai no "conto do vigário" quem quer.

Em Setúbal, dois irmãos portugueses foram, como conta o jornalista Rogério Matos, acusados pelo Ministério Público de terem matado por ódio racial, com disparos de caçadeira, um imigrante indiano. O crime aconteceu a 5 de novembro de 2023, em Praias do Sado, Setúbal, e, no ataque à casa onde Gurpreet Singh, de 24 anos, vivia com cinco compatriotas, ficou também ferido um outro cidadão indiano.

Em Braga, dois videntes, especialistas em "trabalhos de astrologia", estão, por sua vez, a ser julgados por terem burlado duas pessoas, incluindo uma mulher de 65 anos que pedira ajuda à dupla para recuperar 30 milhões de euro de um prémio do Euromilhões que tinha ganho em França e nunca reclamara. No artigo, o jornalista Luís Moreira relata ainda o episódio de uma testemunha que entrou em transe e começou a contactar com o marido já falecido.

Já a nível nacional, estão a gerar algum debate as palavras da ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, que, numa entrevista, admitiu esta quinta-feira que há uma "certa descredibilização" do Ministério Público e que espera que o próximo procurador-geral da República inicie "uma nova era" e "ponha ordem na casa". Lucília Gago vai abandonar o cargo em outubro, ao fim de seis anos de mandato, e, nos últimos meses, o seu silêncio, nomeadamente sobre a operação Influencer - cujas escutas passaram pelas mãos de 16 juízes - tem sido criticado.

O caso, que incide sobre suspeitas de crimes económico-financeiros na instalação de um megacentro de dados em Sines e na concessão da exploração do lítio e do hidrogénio, culminou na queda do Governo de António Costa, mas não impedirá, ao que tudo indica, o socialista de ascender nos próximos dias à presidência do Conselho Europeu.

Boas leituras!