A simples ideia de poder acabar o "Jornal de Notícias" me parece a morte do próprio tempo, uma espécie de fim de linha para uma identidade que se demite de futuro, que se rasura. Cresci com o JN como primeiro jornal. Era por todas as casas e por todos os cafés. Maturavam-se as ideias que passavam a correr na televisão, quando não havia modo de gravar, de rever, de buscar online prova de tal notícia. As coisas diziam-se uma vez e engordavam nas conversas espantadas das pessoas. Depois, no dia seguinte, o JN era um documento que nos vinha às mãos e a partir do qual se julgava o Mundo e se acreditava em alguma coisa.
Tenho pouca paciência para a disputa entre Porto e Lisboa, ainda que as segundas cidades se vejam sempre vocacionadas a uma posição algo servil. O que me move é a vontade de que cada região se levante por sua própria força, feita de sua própria identidade e protegida pelo orgulho em ser alguma coisa e desbravar futuro. Assim, o que mais me arrelia na secundarização que tantas vezes acontece é a demissão do próprio Porto. O modo como se acostuma a perder as coisas e a ter menos. A ficar para trás, mais conservador e sempre trabalhando pelo elementar porque não se afiguram grandes sonhos, grandes oportunidades.
Os lugares são, de facto, o que os seus habitantes quiserem deles. E eu estou sempre à espera de ver as grandes empresas no Norte, que são as grandes empresas do país, a revelarem o brio de abrirem suas fundações, seus museus, suas escolas, patrimónios de memória e pesquisa, de conservação e criação, que redimensionem as populações a Norte nas suas oportunidades, na sua grandeza.
A imprensa de um lugar não é a visão diminuída ao local, é a ampliação do local à globalidade. É o comportamento do local em função de uma totalidade da qual não se quer furtar. A participação, a inscrição, passa fundamentalmente por decidir suas notícias, seus documentos, a forma como debate o que acontece, como testemunha e como cria sua própria voz.
Se o JN periga, o jornal e seus funcionários, periga o Norte e periga o país, que encolhe cada vez mais ao tamanho de Lisboa. Que é um tamanho intenso mas que, para mim, será sempre absolutamente insuficiente. Se quisermos um país de uns poucos quilómetros quadrados só podemos estar em vocação suicida. Não seria bom, não seria normal.
Como sou invariavelmente crente naquilo que é decente, não concebo que aconteça menos do que uma alteração para melhor. Um modo de renascer que implique a assunção de um compromisso claro da região e do país com aquilo que não se pode perder. É o que espero.
(O autor escreve de acordo com a anterior ortografia)