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segunda-feira, 6 de janeiro de 2025

Paredes-meias com a liberdade

Era um corredor estreito, com uma vida larga. Havia no centro restos de um poço que, em tempos, separou dois lados daquele pequeno espaço, sem nunca dividir ninguém. Pelo contrário. Era ali que se juntavam para encher os cântaros de água e os ouvidos de histórias.

Os telhados tinham várias cores, como se tivessem combinado não combinar. Uns, novos em folha, outros, a acusar a passagem do tempo, acolhendo as gotas da chuva como se acolhem amigos do peito.

Decifrava-se o início de cada casa, não pela porta, mas pela cor, mais ou menos sumida, da cal da parede, ou pelos rostos de quem lá vivia dentro.

Era um misto de vozes e silêncios que não perturbavam ninguém.

Discutia-se futebol e política com a mesma paixão com que se trocavam as receitas dos sonhos no Natal. Ofereciam-se opiniões com a mesma gentileza com que se ofereciam as couves que sobravam nas hortas.

Era um corredor muito estreito, paredes-meias com pessoas muito largas.

Era impossível passarem duas ao mesmo tempo, sem roçarem ombro com ombro e não fazia mal. Entendia-se o espaço que o outro ocupava com a naturalidade de quem aceita a diferença das gentes. Nos tamanhos e nas crenças.

Era um corredor estreito. Apertado.

Não era preciso perícia para lhe caber tanta gente. Todos passavam livres. Faziam parte da mesma rede.

Ninguém era encostado à parede.